segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Pequeno

Essa noite, pela terceira vez tive o mesmo sonho: o céu estava negro, coberto por nuvens tingidas de diferentes tons cinza que não me faziam sentir nem um pouco confortável por tê-las sob minha cabeça. Algumas gotas de chuva tingiam o chão e molhavam meus cabelos. Não ouvia a voz do vento. Seguia em frente pela rua que se esqueceram de nomear e me preparei para descer a mesma ladeira da Rua General Chagas Santos, que desço todos os dias.
Nenhuma lâmpada emanava um fio de luz sequer, o negrume do céu fazia eu me sentir como se estivesse caminhando de olhos fechados. Meus passos eram vagarosos e firmes; tinha medo de escorregar e rolar até que algum muro me segurasse em seus braços, já inconsciente. No primeiro cruzamento com a Rua Estero Belaco nenhum carro passou, nem os cachorros da casa nº 306 latiram, como fazem habitualmente ao sentir minha presença.
A chuva apertava. Comecei a ouvir o sussurro do vento, zunia em meus ouvidos. Cruzei os braços, colocando as mãos sobre as axilas para esquentá-las e não me sentir tão sozinho. O ar estava seco e parecia escasso. Apertei o passo para chegar logo à minha casa. Respirava pela boca. Por alguma razão meu corpo estava quente e conforme expirava uma pequena cortina de fumaça surgia na minha frente.
Alguns metros da minha casa, uma lâmpada, de um único poste de luz, começou a piscar; clareando um pouco o caminho que restava. Olhei para luz e notei que ela iluminou um gigante de concreto, de 20 andares, que me observava e provavelmente me acompanhou durante toda a descida.
Era um edifício cuja construção fora paralisada por conta da crise imobiliária que assolou o país no ano de 2010. Antigamente o edifício simbolizou a promessa de um futuro melhor para algumas famílias que, mas agora é apenas um bloco esquelético e imenso de concreto protegido por infindáveis pedaços de pano que o cobrem como se fossem um véu.
Enquanto o encarava, o vento erguia os trapos que o cobriam, como se o noivo erguesse o véu para beijar a noiva. Senti pena de tudo que ele poderia ter sido com a sua construção. Agora não resta nada senão o vazio.
Subitamente, um estrondo ensurdece meus ouvidos e um raio atinge algo atrás do gigante, sua expressão se modificou. O vento soprava mais forte. O que antes parecia um véu agora se movia com violência, eram braços que se esforçavam para me atingir. Foi como se ele soubesse que eu o observava com algum sentimento próximo à pena e decidiu me punir por isso. Um novo estrondo fez com que eu começasse a correr.
Quando cheguei ao portão de minha casa, minhas mãos tremiam tanto que não conseguia encontrar a chave para abri-lo. Olhei para trás e o gigante me encarava com olhos demoníacos, jurando vingança. Nesse instante eu acordo.
Meu coração está disparado e minhas têmporas estão úmidas. Tenho medo de abrir minha janela, pois sei que aquele monstro está lá fora, olhando para mim, esperando que eu abra minha janela e o encare.
Não importa a vida que corra pelas minhas veias, a alma que recheia esse corpo, sou pequeno.

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