domingo, 20 de janeiro de 2008

O Último Ato (Cap. 1)

1 – A Última Festa.

Era a filha de um antigo amigo de infância. Seu nascimento foi inesperado, como qualquer gravidez de adolescentes, mas ao contrario do que acontece com a maioria dos jovens casais que esperam um bebê, eles viviam felizes e a espera dessa menina apenas acentuou esse sentimento de felicidade entre os dois.

Claro que, como qualquer acontecimento do gênero a família de ambos os lados entraram em desespero, ficaram nervosos, mas como uma tormenta que acontece nas famílias, chegou a calmaria, aceitaram e inclusive regozijaram a chegada da menina chamada Yuki. Decidiram dar esse nome à ela devido seu significado japonês: neve; a língua nativa dos dois, pois sua pele era branca como tal e suas lágrimas quando brilhavam com a luz, pareciam pequenos flocos de neve.

Fui o padrinho distante desta criança, não oficial, mas considerado por ambas as famílias como um parente próximo, apesar de não ter tanto contato com meu amigo como tinha quando éramos menores, sempre ia às suas festas de aniversário e nesse único dia nós conversávamos até o fim da festa e ao terminar ajudava com a limpeza.

Neste aniversário ela comemorava seis anos, já estava crescida e se tornara uma menina simpática e alegre, todos se cativavam muito com sua felicidade. Acreditava que ver a inocência de uma criança leva todos os problemas e trás uma grande paz para os mais caóticos dias.

“Você tem certeza, Kenji?”, disse acendendo um cigarro, olhando na distância Yuki brincando com os familiares. “Yuki é sua filha, você sair assim da vida dela, eu não acho que vai fazer muito bem.”

“Shinji, a situação tá difícil, não consigo achar um emprego e a Bianca tem uma saúde muito frágil para cuidar da filha e trabalhar, não quero entregar esse fardo para ela.”, e sentou-se na cadeira ao meu lado.

“Vocês realmente são almas gêmeas, nunca vi nada do tipo, toda essa “melosidade” me espanta.”, falei dando um trago e assoprando com um sorriso. “Mesmo assim, entendo que suas intenções sejam nobres, mas é importante para o pai participar da vida da filha.”.

“Também acho, mas preciso garantir o futuro dela, Shinji. Sem falar que aqui ela pode contar com a família. Talvez a nossa felicidade esteja condenada a acabar, mas não vou permitir que a felicidade da Yuki acabe.”

“Palavras bonitas, no entanto...”, pensei por um momento nas palavras de uma antiga amiga. “E se a felicidade dela for a felicidade de vocês?”.

“Eu não sei mais o que fazer...”, ficamos em silêncio, acredito que ambos pensássemos no futuro, no que iria ser de Yuki.

“Japão então, não é?”, disse para quebrar aquele silêncio que começava a me incomodar.

“Sim, e você Londres.”, respondeu depois de um instante. “Quem diria que íamos terminar assim, alguns anos atrás não conseguíamos nem pensar no que fazer após a faculdade.”.

“É verdade.”.

A festa continuou, conversei com os familiares e amigos e, quando a noite chegou e as pessoas começavam a ir embora, Yuki apareceu correndo com os braços abertos em minha direção.

“Tioshi! Tioshi!”, gritava ela.

“Ainda não perdeu essa mania, pequena?”, disse abraçando ela e colocando-a na cadeira ao meu lado. “Tioshi é estranho, pode me chamar de Tio Shin.”.

“Não! Tioshi é Tioshi! E sempre vai ser Tioshi pra Yuki!”, deu uma risadinha e ficou balançando as perninhas na cadeira que parecia ser de gigantes perto do tamainho dela.

“Tudo bem, entendi. Pode me chamar assim, mas ainda acho estranho.”.

“Não é estranho! Tioshi é kawaii!”.

“Bonitinho? Ta aprendendo rápido japonês, não?”, perguntei espantado, não imaginava que ela estava crescendo tão rápido, embora talvez o meu espanto tenha sido devido a minha falta de contato com crianças, ela era a única que eu conversava.

“Sim, a ba me ensina.”.

Ba? Ba-chan? A vovó?”.

“Isso! Tioshi...”, falou com uma voz tímida. “conta uma historia pra mim?”.

Contei três historias aquela noite até ela adormecer, após a colocar na cama ajudei com a limpeza da festa. Voltei para casa e no dia seguinte estava em um avião indo para Londres.


--Fim do Cap.1

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